Durante muito tempo em sua vida eu vou viver. Detalhestão pequenos de nós dois, são coisas muito grandes para esquecer e a toda a hora vão estar presentes, você vai ver.
Se uma outra cabeluda aparecer na sua rua, e isso lhe trouxer saudades minhas, a culpa é sua! O ronco barulhento do seu carro, a velha caça debotada ou coisa assim, imediatamente você vai lembrar de mim.
Eu sei que outra deve estar falando ao seu ouvido, palavras de amor como eu falei... mas eu duvido! Duvido que ela tenha tanto amor, e até os erros do meu Português ruim. Imediatamente você vai lembrar de mim.
À noite envolvido no silêncio do seu quarto, antes de dormir você procura o meu retrato, mas na moldura não sou eu quem lhe sorri mas você vê o meu sorriso mesmo assim, e tudo isso vai fazer você vai lembrar de mim.
Se alguém tocar seu corpo como eu, não diga nada, não vá dizer meu nome sem querer, à pessoa errada, pensando ter amor nesse momento, desesperado você tenta até ao fim, e até nesse momento você vai, lembrar de mim.
Eu sei que esses detalhes vão desaparecendo na longa estrada, no tempo transforma todo o amor em quase nada, mas quase também é mais um detalhe, um grande amor não vai morrer assim, por isso, é que de vez em quando, você vai, lembrar de mim.
O que se pede a alguém que se ama?Nada! Apenas se dá. Damos o nosso Ser, o nosso corpo, a nossa alma. Damos o que temos e o que não temos também. Mas o Amor, o verdadeiro Amor é feito de coisas pequenas como nos dizem os Madredeus através da letra fantástica de Pedro Ayres Magalhães. Apreciem a letra, oiçam a música e ofereçam a quem amam...coisas pequenas.
Divorciaste-te de mim quando tinha 3 anos. Sim, sim, de Mim! Não foi da Mãe, não foi da vida rotineira, não foi dos problemas conjugais. Foi de Mim!
Divorciaste-te da candura da minha infância, das histórias de «Era Uma Vez», das brincadeiras com as Barbies, da subida às árvores e aos telhados, do batom roubado à Mãe, das esfoladelas nos joelhos das primeiras aventuras de bicicleta.
Divorciaste-te da minha entrada na Escola, da primeira professora, do meu primeiro ABCe dos números mágicas da Matemática.
Divorciaste-te da minha adolescência, do primeiro soutien, do sangue da puberdade, do primeiro namorado, da primeira desilusão, da ida à discoteca, da perda da minha virgindade.
Divorciaste-te do meu casamento (nem ao altar me levaste) do sonho de tornar realidade a minha casa de bonecas, de ter uma vida e uma família feliz.
Divorciaste-te da minha maternidade, da minha barriga a crescer, dos teus netos que nem sei se o nome sabes.
Sabes que quase me divorciei? Sabes que não consegui cumprir o que jurei? Sabes que há dúvidas que habitam o meu coração? Sabes que nem sempre sou feliz? Sabes que fui acusada de destruir uma família porque não sabia o que eram valores de Família? Tu não me ensinaste esse ideal!
Não sabes a cor que mais gosto. A música que me faz chorar, o meu prato favorito. Não sabes dos Natais que chorei sozinha, bem como, dos dias de aniversário (bastava-me ouvir a tua voz). Não sabes quais são os meus defeitos, nem as minhas qualidades. Não sabes que sou vaidosa e sorridente mas que as lágrimas tão depressa deslizam no meu rosto quando a felicidade se aproxima, como quando sou tocada pelo Anjo da desilusão. Não sabes das noites de insónia, dos medos, da solidão.
Tu roubaste uma parte da minha vida, não conheces a minha dor, mas eu não quero a tua pena. Não sabes o que eu perdi e não ligaste quando a minha vida caiu no abismo da desilusão e que me sinto como uma pedra onde o mar bate - e ela acostumada nada sente.
Não sabes também que te Amo. Afinal, não há nada para perdoar, tu agiste de acordo com os desígnios da tua vida. Mas hoje velho, doente, triste e sozinho não posso deixar de pensar que viveste como se nunca fosses morrer e morres como se nunca tivesse vivido.
Mas sabes Pai... ficou um vazio...
A tua ausência nunca vai chegar ao fim. Sabes que és uma parte de Mim?
Há dias em em que nos sentimos tão imensos que nos igualamos à condição de deuses... outros dias há em que a nossa pequenez é tão grande que nos sentimos invisíveis.
Há dias em que o nosso sorriso ilumina todo o Universo...outros dias há que a escuridão é tão intensa que nos solta nas trevas.
Há dias em que amamos e somos correspondidos... outros dias há que amamos e somos preteridos.
Era um vez um Cisne, de plumagem branca, pescoço esguio e elegante, cabeça altiva e segura.
Vivia num Lago Encantado onde tudo era perfeito: água cristalina, margens de folhagem verde e frondosa, peixes amigos, coloridos e o bicho Homem longe do seu horizonte.
O Cisne era feliz, ou pelo menos pensava que sim, porque todos os dias eram tranquilos e seguros, ele sabia sempre por onde nadar, conhecia bem a temperatura das águas, a sua humidade, as sensações que lhe provocavam o caminho.
Era admirado por todos os habitantes daquele espaço, a todos tocava com a sua pureza singular, a sua harmonia, a sua singeleza.
Um dia, chegou ao Lago um Leão, imponente e altivo, sequioso de matar a sua sede. Bebe, bebeu, e sentiu-se observado.
- Quem és tu, tão puro e doce, branco e sereno? - Indagou o Leão curioso, afinal, era o Rei da Selva e não se apercebera da beleza daquele ser que vivia ali tão perto.
- Sou o Cisne! E tu quem és? – Perguntou candidamente.
- Como quem sou eu ?!?! – Rugiu o Leão indignado – Sou o Rei dos animais, a figura mais importante do reino, e tu…és meu vassalo.
O Cisne ficou deslumbrado com a altivez do Leão, nunca outro animal do Lago lhe tinha falado assim, nunca vira outros animais que não fossem os daquelas águas cálidas e não imaginava que existisse vida para além do seu horizonte.
O Leão foi-se embora incomodado, zangado por não ter sido reconhecido pelo seu súbdito, mas algo naquele Cisne o cativou.
Ele era puro e branco, sereno e macio, perfumado e elegante no deslizar dos seus movimentos.
O Leão só estava habituado a conviver com os seus semelhantes, leões, como ele, de jubas poderosas; de garras afiadas, sempre à espera de atacar as presas; de dentes afiados e acutilantes, prontinhos para devorar os incautos que se atravessavam nos seus caminhos, de pêlo sujo pelo desgaste da vida e marcado pelo sangue da morte.
Raramente se misturava com outras raças, que considerava inferiores, mas aquele Cisne tinha algo de belo.
No dia seguinte, voltou ao Lago dos Encantos sob o pretexto de saciar novamente a sua sede, mas esta não era de água, era de descobrir o mistério de tamanha luminosidade.
- Fala-me de ti – ordenou altivo.
-Já te disse, sou um Cisne. Faço parte de um conjunto de aves palmípedes. Tenho uma vida preciosíssima: todos os dias de manhã, providencio o alimento para os meus irmãos mais pequenos, preparo tudo à minha volta para que se mantenha este um lugar idílico para aqueles que aqui habitam, purifico-me a cada momento na magia das águas e sou quase feliz.
- «Quase feliz»?! O que te falta meu amigo? – indagou curioso o Leão.
- Não sei, mas às vezes oiço uma voz que me diz que há mais vida para além daquela que conheço no Lago; que há outros animais por conhecer; que há uma Terra inteira por explorar. Como é a tua terra Leão?
- É um lugar fantástico! - assegurou ele tentando impressionar o Cisne – é poderosa, tem milhares de outros animais (nenhum tão importante como eu), sim porque eu sou o Rei. Tem também espécies vegetais, tem homens e crianças, tem presas e predadores, mas ninguém na Terra é tão importante como eu, porque sou o Rei dos animais, já te tinha dito?
- Sim – sorriu o Cisne com toda aquela reiteração – já me tinhas dito.
Quanto mais o Leão falava, mais o Cisne se encantava com aquele ser tão poderoso, ele, que era uma ave tão simples, que nunca tinha saído do Lago, tinha um novo amigo, e não era um animal qualquer era um amigo régio.
Por sua vez, o Leão estava consciente do impacto que estava a causar naquele amigo branco, e o seu ego estava cada vez mais insuflado
Curiosamente uma tristeza apoderou-se dele. Realmente era um animal especial mas por alguma razão também não era feliz. Caçava, caçava, caçava, provia o sustento daqueles que dependiam dele; lutava para manter a sua imagem e poder, (sim porque, senão se acautelasse,qualquer outro Leão, de menor juba, usurparia o seu trono).
Lembrou-se de outros tempos,de quando era apenas um leãozito e tinha uma juba que não lhe dava motivos para se orgulhar. Nessa altura passava horas a admirar as estrelas, a lua, e não compreendia por que razão não as podia alcanças. Decidiu então, com a determinação que lhe era característica, que no dia em que fosse rei iria também mandar no céu e desvendaria todos os seus mistérios.
Mas o reinado já ia longo, e nunca tinha conseguido lá chegar. Tocado pela leveza do Cisne, confiou-lhe esta sua amargura, e desabafou com ele esta sua tristeza.
- Há estrelas e lua no céu??? –questionou incrédulo o Cisne.
- Claro! Mas tu não olhas para cima?
- Não – respondeu calmamente – a minha vida é a do Lago, só olho para aquilo que me envolve, não posso desejar os elementos que não posso ter.
- Mas é claro que podes! – assegurou – Deves ser ambicioso. Julgas que eu seria o que sou senão fosse muito exigente e não lutasse por tudo aquilo que os meus olhos vêem?
Subitamente, tocado pela empolgação do momento, o Leão teve uma ideia luminosa, que iria mudar para sempre a vida destes dois seres.
- Vem comigo conhecer o Céu e a Terra!
- Não posso… tenho medo. O Lago é mais seguro, é a única realidade que conheço, não posso sair daqui. Fica tu comigo. Podes matar a tua sede, sempre que quiseres, podes desbravar estas margens e podes conversar sempre comigo.
- Eu no Lago? – Ironizou com desdém - Já imaginaste como ficaria a minha juba? Perderia toda a imponência, o meu aspecto deve ser sempre superior, soberbo, senão perco o respeito dos meus súbditos. Vem tu comigo, vá lá, vá lá, não tenhas medo… eu sou o Rei, lembras-te? Comigo estás protegido, em segurança, não deixarei que nenhum outro animal se aproxime para te fazer mal.
O coração do Cisne bateu com mais força, só o tinha sentido bater assim, quando um caçador se aproximou do Lago para caçar os seus irmãos, mas agora era um bater diferente, as suas penas estavam eriçadas, os seus olhos brilhavam. Decidiu então que iria abandonar o seu habitat e iria aventurar-se em terras de sua majestade.
Foram dias sublimes, aqueles que passaram juntos, o Leão, ufano, mostrava ao Cisne todas as maravilhas de Terra, todos os animais, as rochas, as plantas e a ave deixou-se envolver naquele mundo mágico.
Mas ambos tinham um sonho comum que tardava em se concretizar, faltava-lhes conhecer o céu e as estrelas.
O Cisne pensava sempre que o Leão estava a adoptar a estratégia do Save the Best for Last, e que antes de regressar ao Lago mostrar-lhe-ía o que lhe prometeu E o outro não queria desiludi-lo pois não sabia como lhe dizer que não conhecia o caminho que os faria alcançar o Céu.
Um dia o Leão foi iluminado. Lembrou-se que poderia levar o seu amigo até ao cimo de uma montanha e desta forma estaria mais perto do Céu. Lembrou-se ainda que os Cisnes podem voar e talvez ele conseguisse soltar-se naquela plenitude. Se assim o pensou, melhor o executou e partiram os dois à descoberta.
Quando chegaram ao cimo da montanha, o Leão ficou ainda mais orgulhoso do seu desempenho, afinal, só ele conseguira a Odisseia de retirar o Cisne ao Lago e aproximá-lo tão perto do céu.
Por sua vez, o Cisne estava extasiado com a beleza celeste, com as estrelas cintilantes, com o brilho e luminosidade da Lua. Tudo ali lhe parecia mais puro, mais belo, mais verdadeiro. Era ali que Deus, O todo Poderoso, O que criou tudo e todos, O que brincava com eles às escondidas e se escondia numa nuvem mágica, e era ali que estava ele também, um ser tão frágil e indefeso.
Conhecedor dos pensamentos do Cisne, disse-lhe o Leão:
- Tu és maior do que julgas ser. Eu sou conhecedor do meu reino e conheço todas as características dos animais, sabias que os Cisnes podem voar?
A avezinha nem queria acreditar no que ouvia. Ela que outrora nadava no seu Lago, e não conhecia outra forma de se movimentar, num curto espaço de tempo, já tinha aprendido, com o Leão, a andar pela Terra e agora ele afiançava-lhe que ainda podia voar??? Inacreditável!!!
- Não tenhas medo, abre as tuas asas, deixa que a mão do vento te proteja e descobre tudo o que o Universo tem reservado para ti.
Timidamente o Cisne, abriu as suas esplêndidas asas imaculadas e mergulhou no azul índigo do céu, fazendo assim a viagem mais extraordinária da sua vida, sentindo-se tocado pela energia cósmica do Universo.
Quando regressou, pleno de vida e de amor, agradeceu humildemente ao Leão dizendo-lhe:
- Primeiro mostraste-me a Terra, depois mostraste-me a Lua e agora fizeste-me chegar às estrelas. E uma lágrima feliz deslizou no seu rosto.
Enquanto se olhavam em silêncio e contemplavam as maravilhas do Universo, não perceberam que se aproximava, já há algum tempo, uma Serpente malévola que assim que cravara os olhos no Cisne, desejou espetar-lhe todo o seu veneno, afinal não era todos os dias que andava por ali um animal como aquele.
O Cisne incauto, não percebeu o olhar lascivo da Serpente que se acercava e só quando a sua língua mortífera lhe tocou percebeu que um líquido gelado percorria todo o seu corpo e soltou um grasno de dor.
Incrédulo, o Leão viu a vida do protegido fugir-lhe por entre as patas e gritou com desespero:
- Não morras! Não vás! Não desistas da vida, ainda podes recuperar.
O Cisne, esvaindo-se no seu doce sangue, viu a candura da sua plumagem branca manchada pelo vermelho da morte, e disse:
- Um dia também tu perderás a coroa e o ceptro e no brilho das águas cristalinas, ou no calor da planície, ou ainda no brilho cintilante da Lua, sei que nos iremos encontrar.
Tristemente, o Leão colocou o Cisne moribundo no seu dorso e resolveu levá-lo até ao Lago
Encantado para que pudesse descansar em paz. Ao entregá-lo ao azul das águas, outros Cisnes acercaram-se, desdenhando e desprezando aquele que agora regressava. Afinal, o Cisne ousara voar mais alto, sair daquele porto seguro para explorar o desconhecido, abandonar todos aqueles que sempre ali estiveram, tudo isto para fazer parte dos serões da corte real. Não lhe perdoariam.
O Cisne sentiu todo este desdém, mas também sentiu a dor e o amor espelhados no rosto do Leão.