Faz frio
Faz frio. A chuva bate nas vidraças anunciando que o Inverno chegou e que veio para ficar. Encho a banheira com água a ferver, perfumo-a com sais especiais e mergulho.
São tão poucos os momentos de silêncio, são tão escassos os momentos de tranquilidade e naquela água fumegante há todo um Universo de energias a recuperar. Invade-me uma sensação de calor e prazer, toda a minha fadiga se dissolve naquela temperatura, todo o meu corpo agradece o conforto.
No leitor de CD toca Sting confirmando aquilo que há muito tempo sei… How fragile are we are. Saio da banheira e mimo o meu corpo com óleo de canela previamente aquecido, um aroma adocicado envolve todo o quarto. Massajo cada centímetro de pele, hidrato um pouco da minha autoestima. Esqueço as imperfeições, ignoro os centímetros a mais, esqueço os centímetros a menos e valorizo o meu corpo naquilo que é… naquilo que eu sou.
Faz frio. Aqueço o meu chá verde com jasmim, coloco as almofadas no chão e meto mais lenha na lareira, deixo que a manta de pelo de ovelha me aninhe, fecho os olhos e agradeço… No brilho do lume da lareira incendeiam-se episódios da minha vida. A infância, a adolescência, os amigos de outrora, os amigos de hoje, os amigos de sempre. A família mais próxima, aqueles que já partiram e aqueles que mesmo longe, estão sempre perto. Os filhos… o nascimento, o primeiro sorriso, o primeiro abraço, o primeiro «mamã».
Faz frio… o meu coração vai aquecendo quando lembro os degraus que subi, dos patamares que alcancei, dos trambolhões que dei. Curiosamente, a cada ferida, lambi o sangue, a cada nódoa negra, espalhei a pomada, a cada queda… ergui-me novamente. Não sei onde me agarrei, de que muletas me servi, só sei que encontrei energia para continuar a subir.
Faz frio… não interessa a temperatura lá fora, interessa o que eu sinto no peito. Fecho os olhos… o lume crepita… o chá arrefece… adormeço…