Na Cauda do Teu Piano
Imagem: Michelle Pheifer, Fabulosos Irmãos Baker
Meti a chave à porta e ao meu encontro vieram as notas musicais do teu piano de longa cauda negra. Mesmo antes de ver a expressão do teu rosto, percebo que não estás bem. Só tocas piano quando os teus dias são amargos, só quando a pressão é tão forte que te faz explodir. Nesses momentos, os teus dedos, como varinhas mágicas, transferem para as teclas, todas as emoções que habitam em ti. Invejo-as, porque lhes tocas, são aquelas teclas frias que recebem o calor da ponta dos teus dedos. São elas que são acariciadas e gemem por ti. Queria que me entregasses o teu medo, a tua raiva, a tua frustração, que fizesses de mim a tua alma conselheira. Mas não, é sempre o piano. Amor… eu sou mulher, sou a tua companheira, aquela que te ama e estará sempre aqui... e "sei-te de cor"… Hoje decidi ganhar esta guerra fria e vou entrar nessa partitura. Vou entrar no teu mundo de angústias e roubar ao piano o toque que é meu. Tomo um banho perfumado, passo aquele creme que guardo para os momentos especiais em todas as células do meu corpo. Visto o vestido vermelho de cetim que me escorrega lindamente no corpo. Aquele cujo decote faz adivinhar os contornos do meu peito, o redondo da minha anca, a rigidez das minhas coxas. Calço uns sapatos pretos agulha. Ponho Rímel preto nos olhos e um Batom vermelho. Não esqueço o perfume... aquele que te embriaga e que deixa zonzo como se eu fosse um forte licor. Apago as luzes. Acendo uma vela. Queimo um incenso. Começo a cantar Making Whoopee. Sei que adoras a Michelle Pheifer, que é a mulher dos teus sonhos, aquela das tuas fantasias… mas eu... eu sou real… e estou aqui. Subo para o piano, o vestido sobe insinuando-te debaixo dele, o meu corpo nu. Sento-me perto, cruzo as pernas, e da minha boca continuam a sair doces acordes. Levemente, deixo-me cair para trás, deposito o meu corpo na cauda do teu piano. O meu cabelo espalha-se pelas teclas. A música pára. Huuummm, e agora???