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Há palavras que nunca chegam ao destino...fazem uma longa e amarga travessia pela solidão dos sentidos e morrem na escrita destas crónicas.

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Há palavras que nunca chegam ao destino...fazem uma longa e amarga travessia pela solidão dos sentidos e morrem na escrita destas crónicas.

Crianças Vítimas de Maus Tratos

por aspalavrasnuncatedirei, em 22.02.07

 

   Imagem: João Gil

 

Hoje ao abrir o jornal deparei-me com a terrível notícia da morte de uma bebé de 11 meses, que se suspeita que tenha sido vítima de maus tratos. Esta criança chegou ao Hospital de Vila Nova de Gaia já sem vida, apresentava hematomas e escoriações na cabeça e no rosto. No momento em que escrevo este post, as causas da morte ainda estão por apurar mas as autoridades desconfiam que esta menina foi vítima de violência por parte dos pais, um casal de 21 e 22 anos, que naquela noite receberam visitas em casa até às 4 da manhã, embriagaram-se, acordaram ao meio dia e dizem que quando foram procurar a filha que, a encontraram morta.

 

Não estou aqui para fazer juízos de valor, nem para acusar ou culpar os pais desta situação, mas se esta bebé não morreu vítima de agressão, existem outras 40 mil crianças em Portugal, segundo um estudo da Dra. Maria José Fernandes, médica pediatra, que anualmente dão entrada nos Hospitais apresentando sinais, nitidamente visíveis, daquilo a que chamo, falta de amor. E estes são os dados de que há conhecimento, mas pergunto eu: quantos bebés e crianças serão maltratadas em situações que nunca se chegam a conhecer, porque não dão entrada nas Urgências dos Hospitais?

 

Bater numa criança é um sinal de covardia, é uma forma animalesca de dizer a alguém que tem um terço, ou metade do nosso tamanho, «Eu é que mando, e tu tens de obedecer», é uma forma grotesca de dizer «Não aprendes a bem, aprendes a mal» e é principalmente uma manifestação de intolerância, de falta de carinho e de amor.

 

O que leva alguém a perder o controlo e bater de forma cega até deixar marcas, até matar? Não é de certeza a atitude da criança! Não é por chorar a noite inteira, por gritar enquanto brinca, ser reguila e fazer as tropelias normais de quem está a crescer e tem o mundo inteiro à frente por descobrir. Nada do que uma criança faça ou diga, justifica a violência que lhe é votada.

 

Então, por que batem os adultos?

Porque a vida lhes corre mal, porque não têm paciência, porque o seu dia a dia está repleto de contrariedades e dificuldades com as quais não sabem lidar e por isso descontam todas as suas frustrações naqueles que são mais fracos, mais desprotegidos e que não têm condições para se defender.

           

Também sou mãe, também perco a paciência, e por isso sei que o nosso ‘copo’ enche consoante o nosso estado de espírito. Quando estamos mais tranquilos é mais fácil lidar com os disparates das nossas pestinhas, sabemos explicar com doçura e discernimento todos os «Não!» mas quando o nosso dia já foi um austero padrasto qualquer coisa nos fere os ouvidos, qualquer gargalhada nos parece um grito, qualquer birra nos parece um desacato à nossa autoridade, qualquer brincadeira nos parece um ataque Taliban. Mas nada, mesmo nada, justifica que se maltrate uma criança.

 

Recordo ainda outros casos que nos últimos anos me chocaram relativamente a maus tratos infantis – a pequena Vanessa, de cinco anos, que em Abril de 2005, no Porto, foi submetida a banhos em água a ferver e esteve 24 horas sem comer, até morrer; a Catarina, de 30 meses, de Ermesinde, que em 2004 morreu após ter sido agredida, queimada com cigarros e abusada sexualmente pelo pai e madrasta (irmã da mãe). Sim, sim, leram bem, não me enganei a escrever, neste mundo, neste país, há pais e familiares que conseguem abusar sexualmente de uma criança de dois anos e meio. Também a Angelina, de 2 anos de idade foi enterrada em Setembro de 2006, vítima de violação. E a lista é interminável…

 

Fico horrorizada só de pensar nisto. Que mentes perversas, doentes são estas, que obtêm um prazer macabro ao molestar sexualmente uma criança pequenina? Que castigo merece esta gente? Conseguirão dormir de noite? Que castigo deve aplicar-lhes a Justiça? Seria mais justa a Justiça Popular? Obterão eles o perdão divino?

 

Uma das razões que no passado dia 11 de Fevereiro de 2007 me fez votar a favor da despenalização do Aborto foi precisamente o facto de achar que nem todos estão «habilitados» para serem pais. Se uma criança não é desejada, se é apenas um acidente de percurso, se nasce para aumentar o valor do abono de família, se é deitada no lixo depois de nascer, se é abandonada ou maltratada, então mais vale não nascer.

 

Hoje estava a ‘pregar um sermão’ ao meu filho mais pequeno, de três anos de idade, e quando ele ficou farto de me ouvir disse-me «Mamã, se não sabes dizer uma coisa fantástica, então não digas nada…» Caíram por terra todos os meus argumentos, no meu rosto iluminou-se um sorriso. O meu pequeno Pedro conhece bem esta frase do filme que ele adora, Bambi, e conseguiu empregá-la na perfeição. Então, calmamente, expliquei-lhe por que ralhava com ele e não foi preciso recorrer a outros métodos para o fazer entender, apenas o meu sorriso, a minha voz serena, o meu colo. Olhei-o e não pude deixar de pensar nos milhares de crianças que não têm este colo, e que no rosto nem sempre recebem o afago de uma mão protectora.

 

 

 

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